Autores: Rafael Ferreira do Santos – Doutorando em Ciências e Biotecnologia; Leonardo Lira – aluno de graduação em Física
Orientação: Prof.ª Dr.ª Lucianne Fragel Madeira e Dr. Gustavo Henrique Varela Saturnino Alves.
Já parou para pensar por que um mosquito resolve picar você e não quem está ao seu lado? Então, calma, existe uma explicação! Os cientistas e pesquisadores no assunto tem a resposta e tem a ver com o odor que exalamos. Como assim?! Os mosquitos usam o olfato como principal meio de detectar seu alimento.
Uma breve explicação
Os mosquitos fêmeas como o do Aedes aegypti e Anopheles Gambiae (não se preocupe com os nomes, são apenas denominações científicas) encontram seus hospedeiros humanos para obtenção de sangue, pois ele é fundamental na produção de seus ovos. Por isso são denominados hematófagos (hemato=sangue + fago=comer). Alguns outros exemplos de animais hematófagos: pulgas, piolho e carrapatos, além de outros que em uma próxima oportunidade falaremos.
Devido a esse hábito de se alimentar de sangue podem trazer consigo, doenças transmissíveis aos seres humanos e a outros animais. Dessa forma, se tornam eficientes em transmitir organismos (vírus) capazes de causar doenças a seus hospedeiros (PETERSEN et al, 2016). De acordo com González (2022) as enfermidades que os mosquitos propagam já vitimou mais pessoas do que todas as guerras juntas e, só em 2018, foi responsável por cerca de 72.500 mortes. Situação preocupante que impulsionou a Assembleia Mundial da Saúde a aprovar, em 2017, uma resposta global para controle de vetores.
Mas vamos voltar ao título desse texto: mosquitos escolhem as vítimas pelo cheiro. Isso não é uma verdade por completo. Esses mosquitos interagem com informações sensoriais diversas como dióxido de carbono (CO2), calor, umidade, informações visuais e o próprio odor (RAJI & DEGENNARO, 2017).
Mas como ocorre essa detecção por parte dos mosquitos?
De acordo com Verhulst e colaboradores (2011) o que atrai os mosquitos são nossos nossos odores corporais e sua mistura complexa de produtos químicos voláteis (produtos com facilidade de transitar entre fases seja líquida para gasosa, seja do sólido para o vapor) além, claro, da microbiota (microrganismos que habitam um ambiente) de nossa pele gerando. Esta combinação de fatores é diferente de um indivíduo para o outro.
Agora vamos a um parágrafo mais técnico apenas a título de curiosidade
Algumas substâncias já haviam sido identificadas há algumas décadas como odores atrativos humanos causadores de respostas eletrofisiológicas e comportamentais. Como exemplos temos a amônia, ácidos carboxílicos, ácido láctico, cetonas, sulfetos e 1-octen-3-ol (PITTS et al., 2017). Por possuírem diversidades de receptores olfativos, os mosquitos distinguem odores dispersos no meio ambiente (HANSSON & STENSMYR, 2011).
Que receptores são esses? Os pesquisadores chamam de: Receptores Odorantes, Ionotrópicos e gustativos. Bora simplificar! O primeiro é responsável pela percepção de odor, o segundo, pela resposta rápida e de curto prazo e a terceira, sensível à presença de CO2 (LU et al., 2009).
Uma conquista científica animadora
Depois de realizados testes em laboratório, verificou-se que esses receptores necessitam estar ligados a outros receptores chamados de Orco. Em laboratório, os mosquitos A. aegypti ao terem seus receptores ligados (receptor+receptor) retirados ou alterados, diminuem sua resposta eletrofisiológica para alguns odores mas não para todos (DEGENNARO, et al., 2013). Na presença de CO2 os mosquitos modificados (com receptores retirados em laboratório) não perderam a atração pelo odor humano em relação aos mosquitos selvagens (da natureza/com receptores intactos). No entanto, na ausência de CO2, os mosquitos com receptores alterados, perdem fortemente a atração pelo odor humano (MCMENIMAN et al., 2014).
Compreender quais os fatores que intervêm na preferência dos mosquitos para picar uma ou outra pessoa, ajudará a determinar e diminuir os riscos de propagação de enfermidades infecciosas transmitidas por esses vetores como Zika, dengue, febre amarela, chikungunya, encefalitis de San Luis, filariasis linfática.
Saiba mais em:
DeGENNARO M.; McBride C.S.; Seeholzer L.; Nakagawa T.; Dennis E.J.; Goldman C.; Jasinskiene N.; James A.A. Vosshall L.B. orco mutant mosquitoes lose strong preference for humans and are not repelled by volatile DEET. Nature. 2013; 498: p. 487-491
MCMENIMAN C.J.; Corfas R.A.; Matthews B.J.; Ritchie S.A.; Vosshall L.B. Multimodal integration of carbon dioxide and other sensory cues drives mosquito attraction to humans. Cell. 2014; 156: p. 1060-1071.
HANSSON B.S.; Stensmyr M.C.; Evolution of insect olfaction. Neuron. 2011; 72: p. 698-711.
VERHULST N.O.; Qiu Y.T.; Beijleveld H.; Maliepaard C.; Knights D.; Schulz S.; Berg-Lyons D.; Lauber C.L.; Verduijn W.; Haasnoot G.W. et al. Composition of human skin microbiota affects attractiveness to malaria mosquitoes. PLoS ONE. 2011; 6: e28991.
RAJI J.I.; DeGennaro M. Genetic analysis of mosquito detection of humans. Curr. Opin. Insect Sci. 2017; 20: p. 34-38.
PITTS R.J.; Derryberry S.L.; Zhang Z.; Zwiebel L.J. Variant ionotropic receptors in the malaria vector mosquito Anopheles gambiae tuned to amines and carboxylic acids. Sci. Rep. 2017; 7: 40297
GONZÁLEZ, Raúl Rivas. Por que os mosquitos picam mais a uns do que a outros?.
LU T.; Qiu Y.T.; Wang G.; Kwon J.Y.; Rutzler M.; Kwon H.-W.; Pitts R.J.; van Loon J.J.A.; Takken W.; Carlson J.R.; Zwiebel L.J. Odor coding in the maxillary palp of the malaria vector mosquito Anopheles gambiae. Curr. Biol. 2007; 17: p. 1533-1544.
PETERSEN L.R.; Jamieson D.J.; Powers A.M.; Honein M.A. Zika Virus. N. Engl. J. Med. 2016; 374: p. 1552-1563.